segunda-feira, 20 de abril de 2009

Alunos de 18, ou País de 20?

Falava-se há dias, entre amigos, fora do meio académico, na quantidade elevada de jovens estudantes que acedem à Universidade em Portugal com médias de acesso altíssimas, sendo uma percentagem bastante considerável acima dos 18 valores. Noutros tempos, dizia um dos meus amigos, essas médias eram características dos cursos de medicina e mesmo nesses só alguns alunos as conseguiam obter – eram os “lentes”.

Outro conviva aventava a hipótese de, a curto/médio prazo, ter que se estabelecer uma tabela classificativa mais alargada, aí até aos 30/40 valores, já que se torna quase insustentável diferenciar centenas ou milhares de alunos, a nível nacional, com recurso apenas às décimas. Ou seja, falar-se hoje em média final do ensino secundário abaixo de 15 valores equivale quase a negativa (é, pelo menos, um resultado negativo), já que não permite ao aluno escolher o curso que quer mas apenas sujeitar-se ao que sobra. Não quer dizer que haja cursos maus, o que é mau é um estudante sujeitar-se a uma formação numa área para a qual se não sente minimamente vocacionado. No fundo, dizia o indivíduo, actualmente a tabela já não é de 0 a 20 mas sim de 17 a 20. É uma margem muito pequena (3 valores, apenas) para distinguir tanto estudante (referindo-se, obviamente, aos que escolhem o curso que querem).

Noutro sentido, uma opinião sugeria que, para além das médias finais, deviam os alunos sujeitar-se a rigorosos testes vocacionais. Mas testes rigorosos, dizia, espaçados no tempo, ao longo dos anos e nos diversos ciclos do ensino, e levados a cabo por entidades idóneas, imparciais e autónomas, não desses exames que já se fazem mas que são feitos particularmente, em gabinetes de psicologia de qualidade duvidosa e que acabam sempre por prescrever vocações que enchem o ego ao cliente que paga a bom preço essas consultas.

Um dos presentes, que me conhece melhor que os restantes, e numa tentativa de me provocar, quis saber como eram na realidade esses jovens de médias de 18 valores, já que lido agora de perto com eles: se correspondiam, de facto, à qualidade que os seus currículos literários anunciam.

A minha resposta não satisfez o meu amigo, antes o deixou pensativo. E a resposta que eu lhe dei foi a seguinte: Hoje, dado o desenvolvimento intelectual dos alunos, a pobreza dos programas curriculares, o manancial infindável de auxiliares de estudo de todas as formas e feitios (na Internet; em livros especificamente concebidos para a preparação do exame nacional; hipotéticos exames nacionais resolvidos; Escola Virtual; variadíssimos recursos áudio visuais; centros de explicações de qualidade; etc.) bem como a previsibilidade dos exames nacionais, são elementos mais do que suficientes (diria até sobrantes) para que qualquer estudante minimamente aplicado e ciente daquilo que quer, obtenha médias finais no ensino secundário acima dos 18 valores.

Mas, termos alunos de 18, individualistas, egoístas, amedrontados, sempre com medo de intervir nas aulas, receosos de que se descubra que os seus conhecimentos afinal não reflectem a nota que obtiveram no Secundário; com medo de participar nos Blogues com textos de crítica e/ou opinião para não se comprometerem porque sabem que eles são lidos por estudantes, professores, políticos e empregadores e, simultaneamente, termos um país de nota 10, de que nos vale afinal?! Qual a vantagem para o país?!

Quanto a mim, e julgo que a realidade me não deixa mentir, mais importante do que ter alunos de nota 18 (com as características e pavores que atrás anunciei), é conseguir um país de nota 20. E isso pode conseguir-se com alunos de nota 15 (ou inferior) se trabalharem em conjunto, imbuídos de um espírito de partilha, cooperação e colaboração (de volta as minhas estimadas palavras mágicas) e em prol de um único desígnio: o bem-estar comum ou a felicidade colectiva ou a harmonia social.

(Para os curiosos, a minha média de acesso à FDUP foi de 17,5 valores – 18,1 do Secundário mais o exame nacional de História –, mas quem sabe um 12 me assentasse melhor, já que me sinto tão ignorante).

2 comentários:

Manuel Marques Pinto de Rezende disse...

Luís, este texto tem incrível valor. pudesse a cultura académica basear-se mais neste tipo de pensamento de amor pela sabedoria em vez de "coleccionismo" de sabedoria, e talvez houvesse uma maior prioridade no que toca aos "deveres do estudante".

Vasco PS disse...

Muitas vezes tento participar nas aulas, se bem que, e como já tive oportunidade de comentar com muitas pessoas, sem ter estudado. Com efeito, há momentos em que tenho mais que fazer e, decorrar o que alguns Professores dizem não é prioridade. E temos sempre professores que, mesmo quando tentamos, nos olham como se fossemos os maiores ignorantes. E outros que, lamentavelmente, quando se apercebem que o aluno não sabe definir "a", lhe perguntam de seguida a cor de "a", o tamanho, a textura, as vantagens, as desvantagens, os defeitos. Se não sabemos o que é "a" não vamos saber o resto; tudo para provar que sabem mais? Não é novidade. Um bom aluno faz-se de valores (especialmente, inter-ajuda) e muita cultura geral e sentido crítico. Agora decorar coisas, por favor, é um exigência ridícula. E mais, ainda por cima, há que saber a visão do Prof. "a" e não do "b".

Excelente análise Luís.